Por Marcela Chanan
Viver o cotidiano sensível com bebês e crianças é estar presente, inteiro, disponível, atento, curioso, interessado, em busca. Aberto ao inesperado, as sutilezas, as miudezas, as metáforas e a tantas outras especificidades de ser educador(a) da infância. Maravilhar-se com a potência das crianças que nos ensinam diariamente.
Costumo dizer que observação e escuta andam de mãos dadas, não consigo imaginar uma sem a outra - é como se também escutássemos com os olhos. Já pensou sobre isso?
A atitude permanente de escuta está ligada a concepção de criança, ou seja, a imagem de criança que cada um carrega dentro de si, construída a partir da história pessoal (memórias e experiências) de cada um. Por isso, muitos pontos de vista, diferentes ângulos, olhares e interpretações em um grupo de adultos.
Escuta é mais que ouvir e anotar as falas das crianças, é abrangente. Não é fácil de se ensinar e de repente a pessoa escuta, não é uma receita. É um exercício, uma construção, que envolve estudo, tempo, silêncio, pergunta, troca, continência. Um estado de ser, uma abertura ao outro que acontece na prática e com todos os sentidos. Dar valor e visibilidade ao outro e, consequentemente, a si mesmo. Algumas perguntas ajudam a começar uma reflexão:
Por que você acredita ser importante escutar?
Como foi sua relação com a escuta na infância? Foi escutada?
Você se escuta?
Há algum momento da sua vida adulta onde você escuta outros adultos e é escutada? *Escuta onde o outro não opina, não comenta, não critica, só ouve e acolhe.
A minha observação e escuta tem sido construída a partir de múltiplas referências: Paulo Freire e Madalena Freire, as pedagogias da infância das quais estudo - Pikler, Reggio Emilia e Montessori; a psicanálise, a antropologia, a fenomenologia, as artes visuais e a CNV - Comunicação não-violenta. Veja que não é simples! E as referências podem ser variadas de acordo com o caminho de cada um. É um processo singular que algumas pessoas podem se identificar comigo e outras não, e terem outros percursos.
Acredito que passar por essa experiência de escuta contribui para meu fazer. Estou há alguns anos em um processo de autoconhecimento a partir da psicanálise, também estudo essa escuta psicanalítica e busco colocar em prática.
Desde o começo da profissão valorizo, considero e reflito sobre o que as crianças trazem e essa postura sempre me sensibilizou. Ter uma profundidade nas relações.
A escuta é uma competência para vida, para todas as relações, não só na escola com as crianças, então você pode começar a qualquer momento o tempo todo.
Em outro momento eu escrevi no blog um pouquinho sobre a antropologia, observação e concepção de criança, confira aqui http://culturainfantilearte.blogspot.com/2014/03/o-olhar-do-educador-contribuicoes-da.html. A fenomenologia contribui com o olhar processual, para uma escuta mais ampla e conectiva. Todas as experiências com arte e cultura me trazem conhecimento sobre eu mesma e o outro, sobre estar em relação. E a fotografia com certeza me ensinou muito com o olhar, o foco, o estado de atenção, o micro e o macro.
Então te convido a pensar na sua própria trajetória! E vamos de arte para continuar o assunto:
Depois dessa leitura sensível e poética, reflita: como está sua orelha-criança?
Envolvida, ativa e curiosa com o cotidiano cheio de pesquisa e investigação de bebês e crianças?
Centrada na criança ou em si mesmo?
Aberta ao novo, ao inesperado e ao não saber?
Em busca de sentido e significado?
Atenta as cem linguagens? As muitas formas de expressão?
Interessada no genuíno, no que há de mais rico da infância?
Comprometida com a valorização e a visibilidade do que as crianças trazem?
A observação, a escuta, o estudo, a reflexão e a postura de professor-pesquisador fazem parte da prática pedagógica na educação infantil. Registros, documentação, projetos e planejamentos emergem dos bebês e das crianças no cotidiano. Sem perder de vista o currículo, são os pequenos que nos guiam. E como as crianças são diferentes e os grupos mudam, as práticas do professor também mudam a cada ano.
POR UMA OBSERVAÇÃO E UMA ESCUTA SENSÍVEL!
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